EXISTEM?

Os chamados versículos trinitários, ou seja, aqueles que alistam o Pai, o Filho e o Espírito Santo no mesmo texto e que são usados pelos trinitaristas para tentar indicar um suposta trindade, são escassos na Bíblia contra a esmagadora maioria que alistam o Pai e o Filho juntos e em distinção de posição1. Um deles é II Co. 13.13 “A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo seja com todos vós. Amém.” Como é possível perceber este versículo em nada diz que Deus seja três, nem indica, ainda que indiretamente, uma consubstanciação entre os personagens citados, mas mesmo assim é usado para se tentar provar a trindade. Ora, se há lógica quando se diz que em II Co. 13.13 os três são o mesmo por estarem alistados juntos, então, deveríamos considerar o mesmo para Pedro, Tiago e João porque também são alistados juntos na Bíblia em Lc. 9.28. Curiosamente os apóstolos e mesmo Paulo não era uniforme na forma de pronunciar a chamada “benção apostólica”2 e nem toda epístola tem um doxologia igual: I Pe. 5.14 “Saudai-vos uns aos outros com ósculo de amor. Paz seja com todos vós que estais em Cristo Jesus. Amém”; Rm. 16.27 “Ao único Deus, sábio, seja dada glória por Jesus Cristo para todo o sempre. Amém”, I Co. 16.23,24 “A graça do Senhor Jesus Cristo seja convosco. O meu amor seja com todos vós em Cristo Jesus. Amém.” e etc. Isso prova que não existia uma forma ou fórmula “trinitária” com muitos alegam, mas que apenas os seguidores de Jesus ora se expressavam de uma forma, ora de outra, sem, contudo, revindicarem ou insinuarem igualdade entre as pessoas listadas em suas doxologias, até porque em I Co. 16.23,24 Paulo se inclui junto a Jesus Cristo e, no entanto, não são o mesmo ente.

Outro versículo dos poucos existentes e por isso mesmo bastante citado é Mt. 28.19 “Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”. Aqui também não se diz que os três são parte de uma mesma deidade. Os mais achegados ao estudo das Escrituras já leram sobre as suspeitas que recaem sobre a redação desse versículo. Segundo alguns críticos textuais a redação original é “Ide, e fazei discípulos de todas as nações em meu nome”, esta forma é, também, encontrada nos escritos de Eusébio de Cesareia antes do concílio de Niceia Após o concílio algumas poucas vezes ele citou como consta na versão hoje utilizada. Mas, se o questionamento da redação for de difícil aceitação, então, que se perceba os exemplos bíblicos acerca do batismo. O que realmente salta aos olhos para os estudantes das ocorrências do batismo nas águas é o fato de que em nenhuma das práticas de batismo registrados na Bíblia se vê o uso da chamada fórmula batismal “em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”, ou seja, se, de fato, a ordem foi dada ela não foi cumprida à risca, e, se o objetivo era apenas de mostrar que o batismo ocorreria na autoridade dos três, porque os discípulos não fizerem questão de seguir a mesma ideia?

O batismo tendo como referência Jesus ocorriam já na época de sua pregação enquanto na terra, conforme lemos em Jo. 4.2 “E quando o Senhor entendeu que os fariseus tinham ouvido que Jesus fazia e batizava mais discípulos do que João (Ainda que Jesus mesmo não batizava, mas os seus discípulos)”. Se a pretendida ordem de um batismo em nome de três representantes ocorreu somente na ascensão, em nome de quem batizavam os seus discípulos aos arrependidos antes disso? Se já batizavam em nome dos três, porque não se vê tal prática no registro da sequencia histórica que é o livro de Atos? Ou não se batizava em nome de ninguém e os registros de Atos apenas reflete a desobediência da recomendação “trinômica” dada por Jesus em Mt. 28.19? Se a intenção do registro de Mateus foi apenas dizer que o batismo era em autoridade conjunta dos três alistados, porque não vemos batismo “em nome de Pai” ou “em nome do Espírito Santo” como prática comum dos discípulos, mas apenas usando o nome Jesus?

Sempre que se fala de batismo referindo-se a autoridade ou finalidade da prática, não somente no livro de Atos, mas nas epístolas, está ligado a Jesus e não confirmam a fórmula tríplice do batismo usada pela grande maioria das igrejas de hoje, isto pode ser constado em At. 2.38 “E disse-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo, para perdão dos pecados; e recebereis o dom do Espírito Santo”, At. 8.16 “(Porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus)”, At. 10.48 “E mandou que fossem batizados em nome do Senhor. Então rogaram-lhe que ficasse com eles por alguns dias”, (aqui vale uma observação porque alguns talvez queiram ver na palavra “Senhor” em At. 10.48 uma referência a Yahweh, mas no que tange a pregação relativa ao batismo a referência é Jesus conforme se prova em At. 18.8 “E Crispo, principal da sinagoga, creu no Senhor com toda a sua casa; e muitos dos coríntios, ouvindo-o, creram e foram batizados”, ora Crispo como um dirigente da Sinagora não precisava passar a crer em Yahweh, ele era, de uma forma ou de outra, judeu e já cria em Yahweh, mas precisava crer em Jesus, e nesse texto Jesus é intitulado de Senhor. Outros versículos são At. 19.5 “E os que ouviram foram batizados em nome do Senhor Jesus”, Rm. 6.3 “Ou não sabeis que todos quantos fomos batizados em Jesus Cristo fomos batizados na sua morte?”, I Co. 1.13 “Está Cristo dividido? foi Paulo crucificado por vós? ou fostes vós batizados em nome de Paulo?” e L 3.27 “Porque todos quantos fostes batizados em Cristo já vos revestistes de Cristo.

A expressão iniciada em “no nome…” e não “nos nomes”, tem levantado defensores alegando que a consubstancialidade na Deidade entre os três alistados está expressa ai, mas isso é uma conclusão apressada pois quando se diz “em nome de tal e tal” não se pretende admitir igualdade entre os alistados, mas invocar a autoridade conjunta dos nomeados para legitimação do ato, sem contudo os considerar iguais. Na Bíblia encontramos, por exemplo, em Dt. 18.20 “em nome de outros deuses” ao invés de “nos nomes de outros deuses” e os tais certamente não eram uma poliunidade de deuses consubstanciados. Há também ocorrências bíblicas onde apenas se alistam pessoas se usando a palavra “nome” no singular, como é o caso de Rt. 1.2, que foi traduzido com a palavra nome no plural, mas que no original está no singular: “…o nome de seus dois filhos…” e aqui, certamente, não se requererá, que em Rute 1.2 se esteja falando de um ente composto de dois seres.

Quando se ler em Mt. 28.19 a expressão “em nome … do Espírito Santo”, quem tem a consciência trinitária não se questiona sobre quantas vezes a expressão “em nome do Espírito Santo”, “em nome do Espírito de Deus” ou pelo menos “em nome do Espírito” ocorre dentro da Bíblia. Bem, nas escrituras encontra-se “em nome de Yahweh…” inúmeras vezes como em Dt. 18.22, “em nome de Jesus Cristo”, inúmeras vezes como em At. 4.10, até “em nome de meu Pai” como em Jo. 10.25, mas “em nome do Espírito” é algo inexistente dentro da Bíblia a não ser que consideremos a própria ocorrência de Mt. 28.19 como o único legítimo representante. No entanto os eruditos da própria religião berço do trinitarismo, portanto sem qualquer intenção de tentar diminuir, esconder, ou retirar qualquer passagem bíblica que corrobore a doutrina que eles defendem dentro da mesma Bíblia que usam, testificam Mt. 28.19: “É possível que, em sua forma precisa, essa fórmula reflita influência do uso litúrgico posteriormente fixado na comunidade primitiva. Sabe-se que o livro dos Atos fala em batizar “no nome de Jesus” (cf. At. 1,5 + 2,38 +). Mais tarde deve ter-se estabelecido a associação do batizado às três pessoas da Trindade.”3 essas palavras mostram que a redação de Eusébio de Cesareia, historiador da Igreja e que fez citações dessa passagem Mateus 28.19, provavelmente seja a correta e foi reconhecida como alterada posteriormente pela igreja católica que foi a organização que por muito tempo detinha o domínio sobre o que deveria ou não ser usado na religião cristã.

Há ainda uma relação tríplice em I Co. 12.4,5,6 “Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos”, mais uma vez não vemos qualquer pretensão de consubstanciação, pelo contrário, esta dito no final do versículo que “ é o mesmo Deus que opera tudo em todos”. Tudo surge em Deus que enviou a ambos; o Senhor Jesus e o Espírito Santo. Percebe que não se fala em “Pai”; um possível terceiro, ou melhor, primeiro ente da lista, para então se dizer que Deus é quem opera tudo em todos, como se a reunião dos três fosse esse Deus que opera tudo em todos. Fala-se dos dois, do Espírito e do Senhor e diz que quem opera as coisas neles e em todos nós é Deus.

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1 Várias vezes encontramos na Bíblia expressões “Deus e Pai de nosso Senhor Jesus” como, por exemplo em II Co. 1.3 “Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação” (destaquei)

2 Aspeei porque se costuma chamar benção apostólica as palavra ditas nesse versículo de II Co. 13.13, mas se é, de fato, a Benção Apostólica ela não se repete em lugar algum. Hoje, via de regra, essa redação é usada, em muitas igrejas, mas nos tempos apostólicos não existia uma regra ou uma frase específica para a chamada benção. O curioso é que vários pastores a pronunciam, mas não se reconhecem como apóstolos.

3 A Bíblia de Jerusalém – Edições Paulinas – 1991, pg. 1896, em nota de rodapé a Mt. 28.19.